Até os comemos

Como qualquer cidadão não gosto nada que me atirem areia para os olhos. Incomoda-me ter de esfregar, irrita-me o ardor, mas pior que isso não me agrada a figura de parvo que me obrigam a fazer. Assim sendo, ponho um guarda-chuva, daqueles grandes, à frente da minha delicada tromba e evito que a areia me atinja.

Ora, por muito que o nosso treinador diga que vai tudo bem com a nossa equipa de futebol, que as nossas exibições são boas e que não há razão para preocupações, eu, devidamente protegido pelo referido artefacto protector de areias e demais objectos voadores, consigo ver o que toda a gente que não está ceguinha vê: desde a goleada aos depenados milhafres que não jogamos nadinha e que temos, em alguma situações, tido uma sorte dos diabos.

Como já vejo futebol há uns aninhos valentes também não papo a conversa do Walter ser bom jogador e tal mas que não joga apenas por uma questão de escolha. Não é preciso ser propriamente o José Maria Pedroto para perceber que o Walter não é nada mau jogador, longe disso. Pelo que vi dele parece-me ser um excelente jogador, com algumas falhas como é evidente, e, sobretudo, também não é preciso ser grande génio para perceber que atirar o Hulk para ponta de lança é piorar a equipa. Primeiro, porque o Hulk a ponta de lança não é mau mas é incomensuravelmente melhor num dos lados do ataque. Em segundo, porque sem ponta de lança de raiz tornamo-nos numa equipe que só consegue levar perigo à área adversária em jogadas de contra ataque ou em bolas paradas.

Não custava nada ao André Vilas Boas, que vai ser um dos mais importantes treinadores de sempre do FC Porto, vir dizer que estamos em má forma, que há jogadores que estão longe de produzir o que seria normal, que há outros que ainda não perceberam que estar no banco obriga-os a estar ainda mais motivados para quando chegar a altura deles mostrarem que têm lugar na equipa titular, que o facto dum jogador ser bom – como é o caso do Fucile ou do Walter – não chega para jogar, que é impossível um equipa ter sempre o mesmo nível exibicional ao longo duma época.

A malta não é ceguinha, caro Mister. E nós, como o Mister, somos do Porto. Estamos habituados a ver grande futebol. Também sabemos ver quando não jogamos um caracol e não gostamos nada, mesmo nada, que nos digam que não vemos aquilo que vemos.

Por outro lado, também não gosto daqueles nossos consócios que estão sempre mortinhos para dizer mal para provar umas teses estapafúrdias sobre as qualidades dos nossos atletas ou sobre a gestão do plantel. Dizer que o Moutinho não é um fantástico jogador só porque se embirra com a cara do rapaz é coisa digna dum Manha ou dum Delgado, não dum portista. Dizer que vender o Bruno Alves com 28 anos por 22 milhões de euros não é grande negócio é, tão só, gozar com a nossa cara. Dizer que só temos 3 ou 4 jogadores excelentes e os outros são ou maus ou medianos é só disparatado e não merece mais que um sorriso complacente. Bem sei que estes comentários são fruto dum amor assolapado pelo clube e que não há adepto dum clube que sedento de mais e melhores exibições não perca a tranmontana, mas menos, menos, por favor.

Nestas alturas de menor esplendor, digamos assim, é preciso ter o coração e os ditos no sítio certo. Nem conversas de enganar tolos, nem histerias. A gerência agradece.

E agora, dentes cerrados, tomates de aço, coração de dragão e vamos comê-los.